Produtores, diretores e distribuidores de audiovisual reivindicam que o governo repasse ao cinema infantil 20% dos investimentos públicos destinados à produção audiovisual. Um documento assinado por 50 profissionais de todo o país durante a 7ª Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis será encaminhado à ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, também presidente do Conselho Superior de Cinema (CSC). O CSC é um órgão da Casa Civil da Presidência da República que formula a política nacional do cinema.
É consenso entre os profissionais da área que as crianças brasileiras são muito influências pelas produções norte-americanas, e que o filme brasileiro destinado público infantil tem importância estratégica para a formação de futuras platéias. Faltam filmes de qualidade para crianças e adolescentes, e essas produções poderiam movimentar a economia de toda a indústria audiovisual brasileira, argumentam os signatários da carta. Eles ressaltam que as políticas públicas em implementação pelas diversas instâncias governamentais não contemplam um recorte definido que atenda essas questões de forma satisfatória.
“Iniciativas como o projeto de lei n. 185/8, em tramitação no Congresso Nacional, que dispõe sobre a exibição obrigatória de filmes de produção independente em escolas públicas do ensino fundamental, irão gerar uma demanda ainda maior por conteúdo infanto-juvenil”, destaca o documento encaminhado à presidente do CSC, em referência ao PL apresentado pelo senador Cristovam Buarque (PDT/DF). A carta será entregue a Dilma Rousseff por Solange Lima, membro do Conselho Nacional de Política Cultural e também presidente da Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas (ABD).
Solange Lima foi uma das participantes, na manhã de sexta, 11 de junho, do 2 º Fórum sobre Políticas Culturais voltadas para a Infância, que integrou a programação da Mostra. Ela afirmou que se empenhará na disseminação do cinema infantil nas entidades das quais participa. E que vai tomar de empréstimo uma frase do escritor florianopolitano Franklin Cascaes – cujo centenário foi homenageado na Mostra – para adaptá-la em camisetas com estes dizeres: “Cinema nacional: é preciso conhecer para amar”. Solange sugeriu que a Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis articule sua participação como mostra paralela em festivais de cinema adulto em todo o país.
Outra debatedora no Fórum foi a jornalista Âmbar de Barros, coordenadora do Núcleo Infanto-Juvenil da TV Cultura. Ela deseja formalizar uma parceria com a Mostra que possibilite a exibição de filmes brasileiros para crianças na grade da emissora. “Nosso desafio é encontrar estratégias comuns para que cada vez mais adultos e principalmente crianças conheçam e amem a nossa cultura”, disse. Para Âmbar, numa perspectiva histórica houve avanços na produção audiovisual brasileira para crianças. Entretanto, o número de filmes nacionais exibidos é bem menor que o desejável, e ainda é reduzido o número de pais que optam por trocar de canal e sintonizar em emissoras que exibam programas de qualidade.
Alemberg Quindins, criador da Fundação Casa Grande, de Nova Olinda (CE), enfatizou a importância de as crianças não serem apenas consumidoras, mas também produtoras de audiovisual. Na ONG dirigida por ele as crianças gerenciam e produzem programas de tevê, rádio e peças teatrais, entre outras atividades de protagonismo cultural. “Quando a gente bota a mão na massa e transforma informação em formação é que chega ao verdadeiro conhecimento”, disse o pesquisador autodidata, que define a infância como “um estado de espírito”. Nova Olinda, onde a Fundação está instalada, tem 3,5 mil habitantes e recebe mensalmente 3 mil turistas, em busca dos atrativos da cultura local que lhes são apresentados pelas crianças. O município recebeu selo da Embratur como destino preferencial para investimentos em turismo. “Quem fez isso foram as crianças”, disse.
O Padre Vilson Groh, envolvido em seis projetos de inclusão social na periferia de Florianópolis, destacou como fundamental a articulação em rede de diversas iniciativas positivas. “Mas não podemos só trabalhar com essa visão de gente abnegada que fica passando o pires”, disse. “É fundamental que o Estado assuma seu papel e as políticas públicas coloquem os direitos da criança como prioridade”. Ele exortou os participantes a olharem o potencial dos jovens que vivem nas periferias, de forma a romper com sua invisibilidade e a valorizar seu capital social. Padre Vilson enfatizou a importância de recuperar a beleza da infância frente ao embrutecimento e à violência. “Hoje nós colhemos a produção de 30 anos de uma escola de má qualidade”, disse. “Violento é quem produziu a periferia, quem estruturou esse sistema que faz com que a cultura tenha de ser trabalhada do ponto de vista da migalha”.
A pedagoga Ilona Hertel, assistente de programas socioeducativos do Sesc/SP (Serviço Social do Comércio), apresentou a experiência da entidade na manutenção permanente de parques lúdicos em todas as unidades do estado de São Paulo. “Nossa atuação com a infância passa pela concepção de que a educação é um processo permanente que acontece em todos os espaços e momentos da vida”, disse. “Brinquedo é a proposta do adulto. A resposta das crianças é a brincadeira”. Ela mostrou um vídeo que apresenta o Parque Lúdico do Sesc Itaquera, na zona leste da capital paulista. É um espaço único, concebido especialmente para que os brinquedos e instalações possibilitem a produção de música pela criançada.
A diretora geral da Mostra, Luiza Lins, concluiu o debate lembrando que existe uma enorme demanda por conteúdo infantil de qualidade, tanto pelo público como pelo mercado: “A importância da infância para o cinema brasileiro, para mim, é óbvia”, disse. “Temos que ser propositivos, trabalhar muito e acreditar que podemos mudar”. Um dos espaços possíveis para a difusão e o fortalecimento do cinema infantil é por meio do movimento cineclubista, que está ressurgindo, disse. O Fórum sobre Políticas Culturais voltadas para a Infância foi moderado pela professora Mônica Fantin, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).